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domingo, 23 de maio de 2010

Trofeu Bad Trip

Texto e foto de Valéria del Cueto

Um raio não pode cair duas vezes no mesmo lugar, diz a lenda. Mas como bad trip não é raio, essa pode sim, acontecer mais de uma vez.

Não me culpem, caros leitores. Juro que tentei me livrar desta possibilidade a um mês atrás, enquanto estava sendo muito mal atendida pela dita cuja companhia e trocar meu bilhete aéreo. Mas qual o que, aumentou meu desespero ao saber que uma nova aventura era inevitável, já que havia comprado duas passagens para o Rio com um intervalo de um mês entre elas.

A história da bad trip inicial já contei aqui neste espaço e posso resumi-la em poucas palavras: fome, troca de companhia, roteiro, horário e, finalmente, destino. Fui parar, cinco horas depois do previsto, num aeroporto a quarenta quilômetros da minha casa, em plena madrugada carioca.

Para não perder o bilhete, já que o gerente informou ser impossível a troca, cá estou eu, mais uma vez embarcando em outra aventura. Se depender de minzinha, a última por esta inacreditável companhia. A top zero na soma dos quesitos para uma boa e traquila viagem.

Passei incólume pelo check in, despachei a bagagem e respondi a pergunta da simpática atendente “Corredor ou janela?” optando pela segunda. Ganhei a poltrona 6F para poder apagar entre as escalas Cbá/Goiânia/Confins, encostada na parede, junto a janelinha.

Na hora do embarque recebi uma ligação e, de primeira da fila, acabei sendo uma das últimas a embarcar. Quando entrei na aeronave, meu lugar estava ocupado.

Mostrei gentilmente meu bilhete ao ocupante da 6F. Ele me informou que os assentos estavam liberados e que havia sentado ali por que em seu lugar, na fila 5, havia outra pessoa. Janela, naquela altura, para quem precisava de um apoio lateral para embarcar num sono mais profundo, não havia mais nenhuma...

Rezando uma Ave Maria, dois Pai Nossos e um Glória ao Pai, me dirigi a chefe das comissárias que se dirigiu ao cavalheiro que pediu que fosse liberado seu lugar original, que lhe era de direito. O rolo estava estabelecido, com a comissária decretando que era cada um por si. Foi aí que ela conseguiu o direito de ser concorrer ao Troféu Bad Trip, ao “finalizar” o entrevero com uma pérola comissarial aérea:

- Querem saber? Isso não é problema meu! Paralisamos eu e o outro passageiro, enquanto vinha o complemento: Vou chamar o pessoal de terra!




E assim ficamos, a um passo do início do vôo em que os problemas da cabine de passageiros não diziam respeito a chefe das comissárias da... cabine!

Mas a batalha continuava. O gentil senhor me cedeu seu lugar depois de ouvir os meus motivos e aguardava que lhe cedessem o seu respectivo assento. Eis que surge o representante de terra, informando que o problema “se devia ao fato de Vilhena, em Rondônia, estar sem internet”. Ia esbravejar, juro.Afinal, e nós com Rondônia???? Goiânia, Belo Horizonte, Vitória(!) e Rio de Janeiro, tudo bem, mas a bad trip ser iniciada em Rondônia?

Não tive tempo de reagir quando vi que o portador de tão relevante e preciosa informação, digna de incluí-lo na disputa do Troféu Bad Trip, nada mais era do que meu velho conhecido Jean, gerente local da companhia aérea.

A primeira coisa que reparei foi no embranquecimento dos seus cabelos, muito mais grisalhos que a um mês atrás. Fácil de explicar este fenômeno, pensei com meus botões. Minha atenção se desviou para a súbita perda de cor da sua face, quando ele reconheceu em mim, mais uma vez, a razão dos seus problemas..

Cheguei a pensar, por um momento, que o troféu seria todinho dele. Somando a atuação do último mês com a informação incrível da internet de Vilhena ele era, pensava eu, imbatível. Mas qual o que, ledo engano... A mesma comissária, a quem os problemas da cabine não diziam respeito, olha nos olhos do passageiro deslocado e ainda não acomodado e informa cheia de moral e sabedoria ancestral:

- Meu senhor, o senhor pode escolher seu assento. O que posso lhe garantir é que o senhor vai chegar a seu destino!

Diante de tanta certeza e decisão, após pedir licença, o passageiro despencou na poltrona ao lado enquanto a aeromoça, numa meia volta quase militar, se dirigia à frente da aeronave pelo corredor totalmente vazio. O gerente de terra após se recobrar do susto do reconhecimento da humilde escriba que vos narra tão saborosa situação, havia vazado rapidinho, feliz por fugir de mais um embate que se armava. Tadim, perdeu a chance de levar para casa o almejado troféu Bad Trip.

A comissária de bordo Juliana que não usava identificação, por que, conforme me explicou no final da viagem, havia se esquecido de botar o broche com seu nomezinho na lapela, sem dúvida nenhuma, desta vez, levou a melhor e o prêmio de atendimento aéreo inesquecível.

Alguém se habilita a uma nova bad Trip? Eu, enquanto puder escolher meus caminhos pelos céus do Brasil, garanto que dispenso a possibilidade...

* Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Este artigo faz parte da série Parador Cuyabano, do SEM FIM HYPERLINK "http://delcueto.multiply.com"http://delcueto.multiply.com

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