Elas são realmente tão interessantes?
Ivan Martins
Uma vez conheci uma moça que poderia disputar o posto de mulher mais encantadora do mundo. Linda e espalhafatosa, ela ria alto, falava alto e tinha uma multidão de amigos – além de uma legião de fãs. Poucas mulheres poderiam ser mais queridas ou mais desejadas, mas ela não estava satisfeita.
Seu sonho, ela me disse, era ser misteriosa. Lembro dela com o rosto parcialmente escondido atrás do batente, me olhando com olhos semicerrados e exibindo nos lábios uma expressão desdenhosa – assim, ela dizia, deveria ser uma mulher realmente sedutora, não aquela coisa luminosa e transparente que ela tinha nascido para ser. Eu ria da inocência dela.
Essa história tem alguns anos, mas não saiu de moda. As mulheres, como os homens, têm na cabeça receitas de como deveriam ser – em oposição aquilo que são de verdade.
Outro dia eu falava sobre isso com uma colega e me lembrei do Clint Eastwood. Eu queria ser como ele quando adolescente. Não falo dos olhos azuis ou da cara de gringo, mas da atitude. Seus personagens no cinema eram lacônicos, distantes, intimidadores. Aquilo era um homem de verdade, eu pensava. Não o garoto cordial e sorridente que eu era.
O tempo passa, mas esses estereótipos não desgrudam de nós. Todos os dias se reúne na nossa cabeça um tribunal que julga nossos atos à luz do que deveríamos ser. E raramente nos saímos bem dessa comparação, homens ou mulheres. Há um déficit de expectativa que vai sendo administrado pela vida afora. O tempo e a maturidade ajudam a reduzir o fardo, mas não o eliminam. Dentro de nós permanece uma voz que critica, compara, critica, compara, critica...
Não sei se adianta dar conselhos sobre essas coisas, mas vou fazer as minhas observações.
As mulheres mais interessantes que eu conheço são originais. Elas não cabem nos dois modelos de sedutora dos filmes, que admite apenas as variedades “misteriosa” e “meiga”. Elas são muito diferentes disso. Algumas são tímidas e nos atraem por causa disso. Outras falam demais e nos provocam ternura. Há as brilhantes e as bravas, cuja aprovação nos parece um prêmio. E as safadas, que, ao nos escolher entre tantas experiências e possibilidades, nos fazem sentir realmente especiais.
Nenhuma dessas mulheres é perfeita. Nenhuma delas saiu de um filme de suspense ou de uma comédia romântica com as falas prontas. Elas são de verdade e por isso erram, gaguejam, bebem demais e às vezes perdem as estribeiras, o que as torna humanas e amáveis, no sentido de poderem ser amadas.
Da minha parte, tenho preferência por seres humanos meio perdidos, que parecem perguntar todos os dias o que os trouxe ao mundo e para quê. As pessoas que nasceram com GPS e sabem a cada momento para onde estão indo não me provocam empatia. Tendo a me apaixonar pelas fragilidades dos outros, assim como outros homens que eu conheço se apaixonam pela força e pela virtude das mulheres. Somos diversos, não somos?
O importante, eu acho, é se livrar dos estereótipos. Hoje em dia a moça que queria ser misteriosa já deve saber que ela é um estouro à sua própria maneira escrachada, assim como eu percebi que o Clint Eastwood é genial na tela, mas não cabe nem por um segundo na minha vida.
A gente vive, vai iluminando os pedaços escuros da alma (e da biografia) e percebe que aquilo que fizemos de nós mesmos é mais interessante do que os personagens do cinema.Os modelos que tinham nos vendido na adolescência ficaram obsoletos. A moda no século 21 é ser você mesmo, sem causar danos aos outros e ao meio ambiente.
(Ivan Martins escreve às quartas-feiras)
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