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quinta-feira, 3 de março de 2011

Morre aos 102 anos viúva de Guimarães Rosa

Aracy Moebius de Carvalho Guimarães Rosa, viúva do escritor João Guimarães Rosa (1908-1967), morreu na manhã de hoje de causas naturais, em São Paulo.
Ela tinha 102 anos e sofria do Mal de Alzheimer. Segundo a família, o corpo será velado hoje às 17h.
Aracy e Rosa se conheceram em Hamburgo, Alemanha, às vésperas da Segunda Guerra, quando ambos travalhavam no consulado brasileiro na cidade.
Encarregada da seção de vistos, Aracy ajudou dezenas de famílias judias a fugirem da Alemanha.

O papel de Aracy foi reconhecido com uma placa em seu nome no Jardim dos Justos, no Museu do Holocausto de Jerusalém. É homenageada ainda no Museu do Holocausto em Washington.
Aracy ficou imortalizada na literatura brasiliera com a dedicatória que Guimarães Rosa dedicou a ela no livro "Grande Sertão: Veredas" (1956): "A Aracy, minha mulher, Ara, pertence este livro".
Ela deixa quatro netos e oito bisnetos.
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Uma certa Aracy
(Aracy Moebius de Carvalho)

Ela era paranaense e foi morar com uma tia na Alemanha, após a sua separação matrimonial.
Por dominar o idioma alemão, o inglês e o francês, fácil lhe foi conseguir uma nomeação para o consulado brasileiro em Hamburgo.

Acabou sendo encarregada da seção de vistos. No ano de 1938, entrou em vigor, no Brasil, a célebre circular secreta 1.127, que restringia a entrada de judeus no país. É aí que se revela o coração humanitário de Aracy. Ela resolveu ignorar a circular que proibia a concessão de vistos a judeus. Por sua conta e risco, à revelia das ordens do Itamaraty, continuou a preparar os processos de vistos a judeus. Como despachava com o cônsul geral, ela colocava os vistos entre a papelada para as assinaturas. Quantas vidas terá salvo das garras nazistas? Quantos descendentes de judeus andarão pelo nosso país, na atualidade, desconhecedores de que devem sua vida a essa extraordinária mulher?



Cônsul adjunto à época, seu futuro segundo marido, João Guimarães Rosa, não era responsável pelos vistos. Mas sabia o que ela fazia e a apoiava.

Em Israel, no Museu do Holocausto, há uma placa em homenagem a essa excepcional brasileira. Fica no bosque que tem o nome de Jardim dos justos entre as nações. O nome dela consta da relação de 18 diplomatas que ajudaram a salvar judeus, durante a Segunda Guerra. Aracy de Carvalho Guimarães Rosa é a única mulher nesta lista.

Mas seu denodo, sua coragem não pararam aí. Na vigência do infausto AI 5, já no Brasil, numa reunião de intelectuais e artistas, ela soube que um compositor era procurado pela ditadura militar. Dispôs-se a ajudá-lo, dando abrigo, além dele, a outros perseguidos pela ditadura. Com muita coragem, diga-se de passagem.

Reservada, Aracy enviuvou em 1967 e jamais voltou a se casar. Recusou-se a viver da glória de ter sido a mulher de um dos maiores escritores de todos os tempos. Em verdade, ela tem suas próprias realizações para celebrar. Hoje, aos 102 anos, pouco se recorda desse passado, cheio de coragem, aventura, determinação, romance, literatura e solidariedade. Mas a sua história, os seus feitos merecem ser lidos por todos, ensinados nas escolas. Nossas crianças, os cidadãos do Brasil necessitam de tais modelos para os dias que vivemos.

Aracy desafiou o nazismo, o Estado Novo de Getúlio Vargas e a Ditadura Militar dos anos 60. Uma mulher que merece nossas homenagens. Uma brasileira de valor. Uma verdadeira cidadã do mundo.
Uma mulher fascinante, corajosa, moderna, humanista, que lutou contra tudo o que é de mais perverso e castrador, o Nazismo na Alemanha, a Ditadura no Brasil, com raça e destemor, uma mulher que deveria ter seu nome entre os "heróis" dos nossos livros de História, e até mesmo (por que não?) figurar como nome de rua ou de escolas, esta mulher quando é lembrada, é citada apenas como a esposa do grande escritor Guimarães Rosa. Como denominar tal "ato-falho"? Machismo descarado! Ou alguém teria outra teoria para esse tão dissimulado esquecimento.

Faço um pedido a homens e mulheres inteligentes e com senso de justiça para divulgar esse fato aos mais novos a fim de que essa história tão bonita não acabe navegando pelo mar da obliteração.

**Texto inspirado no artigo "Uma certa Aracy, um certo João", de René Daniel Decol.

(Presente de Ceiça - Natal - RN)

Fonte Ze Carlos Manzano.

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